Gagos são alvo de falsas promessas de cura
instantânea
Entidades nos EUA e na Europa pedem que Google tire do ar
anúncios de soluções milagrosas para distúrbio
Softwares e aparelhos que dizem melhorar fluência da fala não
têm eficácia comprovada, segundo especialistas
JULLIANE SILVEIRA
DE SÃO PAULO
Pessoas com gagueira ainda buscam soluções rápidas para melhorar
a fluência da fala mesmo que não encontrem a mínima comprovação
científica desses métodos.
Nos consultórios e em grupos de apoio, é comum pacientes relatarem
experiências anteriores que não trouxeram bons resultados. Hipnose,
softwares e aparelhos estão entre as promessas.
“Poucos sabem o que é a gagueira. Entra-se na área nebulosa de que
qualquer coisa serve”, diz Claudia Andrade, coordenadora do
laboratório de investigação fonoaudiológica da fluência da fala,
motricidade e funções orofaciais da USP.
As associações britânica e americana de gagueira encabeçam
campanha para que o Google tire do ar vídeos e anúncios de técnicas
que se vendem como curas. O Instituto Brasileiro de Fluência aderiu
à causa.
A gagueira atinge 1% da população em geral e pode afetar 4% das
pessoas em algum momento da vida.
“A única solução mágica é pais e pediatras encaminharem a criança
a um especialista assim que começa a apresentar o problema”, alerta
Anelise Junqueira, fonoaudióloga do instituto.
Apenas na infância é possível curar a gagueira. Depois, o que há são
ferramentas para melhorar a fluência e aprender a conviver com a
dificuldade na fala.
TECNOLOGIA
Softwares e aparelhos que prometem melhorar a fluência também
são encarados como solução imediata.
“As pesquisas não confirmam isso. Os resultados ainda são
contraditórios, os estudos são de curta duração e patrocinados pelo
fabricante. Se o paciente tira o aparelho, a gagueira volta”, diz
Andrade, que finaliza um protocolo de pesquisa para testar esse tipo
de aparelho em gagos a longo prazo.
Em muitos casos, a expectativa do paciente é alta.
“Por mais que expliquemos mil vezes que não é a cura e que podem
gaguejar, ainda que com menor frequência, acham que não vão, que
encontraram a solução de todos os problemas”, defende Érica Ferraz,
fonoaudióloga do grupo Microsom.
A empresa importa para o Brasil o Speech Easy: um aparelho que,
colocado no ouvido, faz a pessoa escutar a própria voz com um
atraso mínimo e em outra frequência, causando o “efeito coro”, o que
ajuda a reduzir sua dificuldade de expressão.
Redes sociais também são uma fuga. Ao se relacionarem por escrito,
gagos podem fingir que não têm o distúrbio e deixam de tratá-lo.
“Um paciente com gagueira gravíssima me disse que não precisava
de terapia porque tinha amigos na internet”, conta Andrade.